Me chame pelo nome

abril 7, 2023
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Por: Paola Arcadi

Tradução por: Andrea Bottoni

Texto publicado originalmente no site do Movimento Slow Medicine Itália, no projeto Histórias Slow, em 21 de maio de 2022.

Andrea é um estudante de enfermagem do primeiro ano. Filho de um médico de família da região, optou por estudar enfermagem porque “o meu pai sempre me disse que às vezes o que falta à medicina é o olhar para o doente e que os enfermeiros talvez sejam mais capazes de estar perto deles”. Ainda me lembro de ter respondido àquela afirmação de que o olhar atento ao paciente não é prerrogativa de uma disciplina em detrimento de outra, e sim um modo de estar na relação que é próprio de qualquer pessoa que opta por cuidar de alguém.

De qualquer forma, fiquei impressionado com sua forma de abordar os estudos, sempre curioso para novos conhecimentos e presente em sua forma de aprender.

Para Andrea, chega o dia do início do estágio. O novo uniforme, o relógio no bolso, o orgulho de quem se aproxima com medo e muitas expectativas de um momento tão esperado por todos os alunos: ingressar pela primeira vez em uma realidade até então apenas imaginada.

Passam-se as primeiras semanas e vou à enfermaria para o habitual briefing sobre o andamento do estágio. Converso com Andrea para saber como ele está, sobre as coisas que o marcaram particularmente, dos pacientes que ele atendeu e dos casos mais significativos sobre os quais ele fez um raciocínio clínico. Ele me fala muito de si, do que está aprendendo, mas sobretudo fala da dificuldade de sustentar o ritmo frenético da enfermaria, de como sobra muito pouco tempo para conversar com os pacientes e de como – às vezes – os funcionários chamam a atenção sobre a sua “lentidão” em fazer as coisas, mesmo que justificada pelo fato de ser um aluno, de estar em formação.

Após ter me despedido dele, enquanto caminho pelo corredor da enfermaria em direção à saída, um paciente se aproxima de mim e diz: “Você é professora do Andrea? Eu só queria te dizer que ele é muito bom. E aí tem uma coisa… no primeiro dia que ele me viu, logo me chamou pelo nome: ‘Senhor Mário, bom dia, como vai hoje?’ Me marcou muito, porque é como se ele me conhecesse antes mesmo de me encontrar e eu realmente me senti acolhido e em casa. É a primeira vez que alguém me faz sentir assim desde que fui hospitalizado.”

Voltei para conversar novamente com Andrea, que estava na sala de medicações e contei a ele o que o “seu” paciente havia acabado de me contar e perguntei por que ele não havia mencionado isso em nossa conversa. Ele olhou para mim, entre surpresa e constrangimento, e disse: “porque eu não achava que era uma coisa tão importante”.

Em seguida, compartilhamos que as palavras que escolhemos têm um poder extraordinariamente poderoso: elas podem curar ou destruir, levantar ou colocar para baixo. Precisamente por este motivo, o nome de cada indivíduo é como a vestimenta do seu ser e nomeá-lo significa reconhecê-lo. Reconhecer uma pessoa é uma grande coisa: significa respeitá-la, escutá-la, transmitir-lhe que ela existe de uma forma única no mundo. No mundo dos entes queridos, assim como no micromundo de um hospital, mesmo de pijama, com uma doença; compartilhamos que isso não precisa de tempo: requer um “olhar”.

Saí daquela reunião pensando que o pai de Andrea simplesmente havia entendido que o filho poderia cultivar aquele olhar. E ele estava certo.


Paola Arcadi é enfermeira, docente, mãe do Edoardo. Trabalha na Direção do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade de Milão – Itália, na ASST Melegnano e Martesana.

Andrea Bottoni é italiano, nascido em Roma; Médico pela Universidade de Roma “La Sapienza”, com Residência Médica em Nutrologia na mesma Instituição; Especialista em Medicina Desportiva, Mestre em Nutrição e Doutor em Ciências pela UNIFESP; MBA Executivo em Gestão de Saúde pelo Insper; MBA em Gestão Universitária pelo Centro Universitário São Camilo; Especialista em Estilo de Vida e Coaching em Saúde pela Faculdade Israelita Albert Einstein; Especialista em Mindfulness, Instrutor de Mindful Eating Aplicado à Promoção da Saúde e Instrutor de Mindfulness Aplicado à Promoção da Saúde pela UNIFESP; Coach de Saúde e Bem-Estar; Coach Ontológico; Título de Especialista em Nutrologia, em Medicina Esportiva e em Medicina Preventiva e Social; vive no Brasil, em São Paulo, felizmente casado com Adriana, também médica.

2 Comentários

  1. A infantilização do idoso agride: fez um vovozinho, um xixizinho

  2. A medicina que faço há 45 anos!!

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