O último sopro de vida

setembro 19, 2016
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Por Marco Bobbio:

“A ciência poderá, talvez, ser o meio mais eficaz para organizar os dados empíricos e reprodutíveis, mas este seu poder origina-se da incapacidade de avaliar os aspectos fundamentais da vida humana: esperança, medo, amor, ódio, beleza, inveja, honra, fraqueza, determinação, sofrimento, virtude”. É um neurocirurgião que chega a estas reflexões, não porque esteja analisando a experiência adquirida durante sua longa carreira clínica, mas sim porque está apresentando uma recidiva de um tumor pulmonar, sabe que terá poucos meses de vida e teve a possibilidade de olhar de forma calma e ponderada o filme de sua vida e de sua experiência profissional.  Paul Kalanithi, após receber o diploma em história e filosofia da ciência, entende que deve tornar-se médico para aprofundar a compreensão dos laços que existem entre o cérebro e a consciência. Com 36 anos, após terminar o curso médico e alguns dificílimos anos de especialização, está preparado para entrar na carreira acadêmica, mas descobre que tem um tumor pulmonar em fase avançada: “Neste momento – ele conta no extraordinário livro que testemunha sua vida – eu tinha aprendido algumas regras fundamentais. A primeira é que as estatísticas pormenorizadas se aplicam bem nas aulas de pesquisa, mas não nos quartos dos hospitais”. Não é suficiente formar-se em filosofia e em medicina para compreender quais são as coisas que contam, assim como não é necessário ficar doente e sentir a aproximação da morte para compreendê-las. É suficiente que os médicos desçam de seu pedestal, deixem de lado as estatísticas e a ambição de querer impor aos pacientes o melhor tratamento, e aprendam a ouvir os doentes. Cada paciente sabe o que pode esperar da vida, dos tratamentos, da assistência; há quem queira enfrentar qualquer tratamento para poder viver alguns dias a mais, há quem prefira viver seus últimos dias serenamente, cercado por seus familiares. O movimento Slow Medicine nasceu para ajudar os médicos a refletir que um tratamento respeitoso representa um valor adicionado aos tratamentos impostos pelas guidelines. Aprendendo a ouvir tornar-nos-emos médicos melhores, pois, como diz Kalanithi, “nenhum sistema de raciocínio poderá abranger dentro de si a experiência humana em sua totalidade”. Trata-se de um comovente testemunho que nos ajuda a compreender que a morte pode nos ensinar também a viver.

(traduzido do italiano por Dario Birolini)

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Marco Bobbio é o autor do livro O Doente Imaginado, obra essencial da Slow Medicine. Médico, especialista em Cardiologia, é membro ativo da Associação Italiana de Slow Medicine e colaborador da campanha Choosing Wisely Italy.

2 Comentários

  1. “Aprenda como viver, e você saberá como morrer
    Aprenda como morrer, e você saberá como viver” Morrie Schwartz
    Em meio à alta tecnologia, ao materialismo de nossa época, o tema Finitude nos desafia a pensar em algo mais alto e além de nossa própria capacidade, de nosso próprio domínio e controle.

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